Resumo
A preguiça é tradicionalmente associada à falta de vontade para o trabalho, mas seu sentido profundo, especialmente no campo filosófico e espiritual, revela um vício mais complexo: o abandono do dever, a apatia diante da vida e a resistência ao crescimento moral. Este artigo analisa a preguiça à luz dos ensinamentos maçônicos, propondo que ela seja enfrentada com disciplina, propósito e ação consciente. A Maçonaria, ao valorizar o trabalho constante e o progresso interior, ensina o obreiro a transformar a inércia em força criadora, promovendo a superação do comodismo e o despertar da consciência ativa.
Introdução
A tradição cristã, influenciada pela Patrística e Escolástica, classificou a preguiça como um dos sete pecados capitais, compreendida não apenas como a ausência de ação física, mas como uma recusa interior ao cumprimento do bem. Segundo Tomás de Aquino (2001), a preguiça (acídia) é a tristeza diante do bem espiritual — uma espécie de resistência da alma à elevação.
No mundo contemporâneo, a preguiça ganha novas formas: procrastinação crônica, alienação digital, indiferença diante da vida comunitária e ausência de compromisso com o crescimento pessoal. Dentro da Maçonaria, a preguiça é vista como inimiga do progresso do espírito e como obstáculo à construção do Templo interior. A Ordem propõe o trabalho como dever sagrado, e o combate à preguiça como exercício constante de autodomínio.
Desenvolvimento
O que é a Preguiça: além da inércia
A etimologia da palavra “preguiça” (do latim pigritia) está ligada à lentidão e à resistência ao esforço. No entanto, o conceito filosófico vai além: trata-se da recusa em agir, pensar ou crescer. É a paralisia do espírito frente ao chamado do dever, da verdade e da virtude.
O teólogo Evágrio Pôntico já falava, no século IV, da acídia como o “demônio do meio-dia” — aquele que ataca o monge quando deveria estar mais produtivo, fazendo-o cair em melancolia, desprezo pelo trabalho e indiferença espiritual. É, portanto, um veneno da alma, capaz de silenciar a consciência.
A sociedade moderna, ao valorizar apenas os resultados e não os processos, acaba por estimular comportamentos que mascaram a preguiça como “direito ao ócio absoluto”. Mas o ócio criativo, como defendia Domenico De Masi, é diferente da paralisia existencial — essa, sim, é a preguiça nociva que este artigo aborda.
A Preguiça na simbologia maçônica
Na Maçonaria, o trabalho é símbolo central. A construção do Templo é uma metáfora do aperfeiçoamento do ser, e isso exige esforço contínuo. A preguiça, nesse contexto, é um desvio de rota — representa o abandono das ferramentas simbólicas, a negação da lapidação pessoal.
A imagem do aprendiz com o malho e o cinzel em mãos é clara: sem trabalho, não há progresso. Um maçom preguiçoso é aquele que assiste às sessões, mas não se transforma; que repete palavras, mas não estuda; que se diz obreiro, mas não constrói nada.
Além disso, a preguiça pode se manifestar na Loja como desinteresse pelas obrigações, falta de pontualidade, omissão em tarefas coletivas ou apatia diante dos estudos simbólicos. Esses comportamentos enfraquecem o Corpo Maçônico e desviam a Loja de sua função edificadora.
Como a Maçonaria combate a Preguiça
A superação da preguiça não se dá com culpa, mas com consciência. A Maçonaria propõe ferramentas simbólicas e práticas que permitem ao obreiro reverter o estado de inércia em movimento e propósito:
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Trabalho ritualístico: A repetição dos ritos disciplina a mente e reforça a importância do agir com intenção.
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Estudo constante: O conhecimento ilumina e motiva. Um maçom que estuda tem sempre um objetivo interno.
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Prática da virtude: A Maçonaria convida à ação justa, à coragem, à temperança. Isso exige força de vontade.
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Compromisso com a Loja: O envolvimento fraterno exige presença, participação e serviço — tudo o que contradiz a preguiça.
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Despertar espiritual: A Maçonaria lembra que a vida é breve e que o tempo deve ser usado com sabedoria.
Conclusão
A preguiça, embora muitas vezes tratada com leveza no senso comum, é um dos mais perigosos venenos do espírito. Ela paralisa o crescimento, afasta o indivíduo de sua missão e deteriora a estrutura simbólica da vida. Na Maçonaria, onde o trabalho é símbolo sagrado, não há espaço para o comodismo. A pedra bruta só se torna cúbica por meio do esforço constante.
O maçom que reconhece a presença da preguiça em sua vida não deve se envergonhar, mas agir. Cada pequeno gesto de superação é um passo na direção da luz. Como obreiro da moral, ele é chamado a agir com diligência, a estudar com fervor e a servir com alegria. Só assim poderá construir, dentro de si, um Templo digno do Grande Arquiteto do Universo.
Referências Bibliográficas
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AQUINO, Tomás de. Suma Teológica. Trad. Alexander Broadie. São Paulo: Loyola, 2001.
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DE MASI, Domenico. O Ócio Criativo. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.
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FRANCO, Divaldo P. Leis Morais da Vida. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. Brasília: FEB, 2006.
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GOB – Grande Oriente do Brasil. Constituição do Grande Oriente do Brasil. Brasília: GOB, 2019.
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LIMA, Claudio. Filosofia Maçônica. São Paulo: Madras Editora, 2008.
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MACKEY, Albert G. Encyclopedia of Freemasonry. Masonic History Company, 1914.
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PÔNTICO, Evágrio. Tratados Ascéticos. São Paulo: Paulinas, 1999.