Quando o Brasil acordou na manhã de 15 de novembro de 1889 sob um novo regime político, poucos imaginavam que parte decisiva daquele movimento — aparentemente simples, quase sem resistência — havia sido articulada ao longo de décadas dentro de templos discretos, silenciosos e profundamente influentes: as Lojas Maçônicas.

A Maçonaria não apenas inspirou debates, mas proporcionou o ambiente necessário para que ideias republicanas encontrassem coesão, eco e proteção. De seus templos emergiram líderes, projetos de Estado e princípios que estruturariam os alicerces do Brasil moderno.

As origens intelectuais do republicanismo no Brasil

Desde o início do século XIX, a Maçonaria já desempenhava forte papel como centro de difusão de ideias progressistas. As lojas funcionavam como verdadeira intelectualidade subterrânea: ali se discutia liberdade de expressão, educação laica, reforma administrativa e o futuro da nação.

Durante o governo imperial, grande parte dessas discussões era considerada subversiva. O templo maçônico tornava-se, portanto, um dos poucos espaços onde militares, juristas, jornalistas e cientistas podiam debater livremente.

Entre a Abolição e a República: a Maçonaria como ponte

Com a intensificação das tensões políticas e sociais no fim do século XIX, a Maçonaria se transformou em um dos motores das mudanças estruturais:

  1. Debate sobre a emancipação dos escravos
  2. Críticas ao poder centralizado do Imperador
  3. Defesa da laicidade do Estado
  4. Expansão da instrução pública
  5. Visão de um projeto de país mais democrático

A proximidade entre abolicionismo e republicanismo também se fortaleceu dentro das lojas. Muitos abolicionistas eram maçons; muitos republicanos, igualmente.

Os protagonistas da Proclamação

Do movimento que culminou na Proclamação da República, destacam-se vários nomes diretamente ligados à Maçonaria:

  1. Marechal Deodoro da Fonseca – Grão-Mestre do GOB quando proclamou a República

  2. Floriano Peixoto – Maçom de longa atuação militar

  3. Benjamin Constant – grande entusiasta da organização republicana

  4. Rui Barbosa – intelectual influente e visionário da nova ordem

  5. Quintino Bocaiuva – principal articulador civil do movimento

Esses personagens não atuavam de forma isolada — sustentavam-se em redes de confiança construídas ao longo de anos dentro dos templos.

O Grande Oriente do Brasil: epicentro da modernização

Entre 1870 e 1889, o Grande Oriente do Brasil (GOB) funcionou quase como uma “academia política paralela”. Ali circulavam:

  1. discursos de intelectuais

  2. projetos de reorganização do ensino

  3. propostas de reestruturação das Forças Armadas

  4. debates sobre o futuro regime político

Relatórios históricos indicam que, em 1888 e 1889, o GOB chegou a reunir militares e civis para avaliar cenários de transição pacífica.

O legado simbólico

O espírito republicano incorporou princípios maçônicos em seu discurso oficial:

  1. Liberdade → participação política ampliada

  2. Igualdade → fim dos títulos nobiliárquicos

  3. Fraternidade → cooperação entre cidadãos e Estado

  4. Laicidade → separação entre Igreja e governo

Além disso, inúmeras escolas, bibliotecas e instituições filantrópicas criadas por maçons ajudaram a consolidar os novos valores republicanos.

A República sem a Maçonaria seria possível?

A historiografia contemporânea é quase unânime: a Proclamação poderia até ocorrer em algum momento, mas dificilmente com a rapidez, a articulação e a coesão observadas sem a influência maçônica.

Nas palavras do historiador britânico C. R. Boxer, “a Maçonaria atuou como vigorosa corrente subterrânea da política brasileira”.

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